Como as mulheres negras, indígenas e rurais salvam o futuro hoje

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ODS 10 
Reduzir a desigualdade dentro dos países e entre eles

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“As mulheres negras podem e devem liderar o processo de redefinição do futuro. Elas colocam que não é porque [o mundo] é assim que sempre vai ter que ser assim”. A fala é da socióloga Ana Carolina Lourenço. As mulheres constroem, hoje, um outro futuro possível, apesar da crise iniciada pela pandemia de Covid-19, que já matou mais de 100 mil brasileiros, e foi fortalecida pela resposta ineficiente do governo brasileiro.

Assistimos, no primeiro semestre deste ano, à perda de 1, 2 milhão de empregos com carteira assinada, segundo dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), divulgados pelo Ministério da Economia. As mulheres desenham uma mudança completa, não só do sistema político, mas do pensamento sobre a organização da vida coletiva. Em um momento onde a desigualdade e o modo de produção causam ainda mais desastres, mulheres negras, trabalhadoras rurais e mulheres indígenas estão no fronte, pautando uma sociedade que tenha em sua centralidade o bem viver coletivo.

“Compartilho da ideia de que as comunidades diretamente afetadas pelos efeitos mais perversos de uma democracia falha, de um estado produtor de violências, de políticas públicas racionalmente pensadas ineficazes, em geral, são portadoras das principais respostas para enfrentar esses efeitos”, diz Ana Carolina, 30, coordenadora política do Mulheres Negras Decidem, movimento que busca fortalecer a democracia brasileira usando como estratégia a superação da sub-representação de mulheres negras nas instâncias de poder. Em abril, no segundo mês da quarentena no Brasil, ela e outras mulheres do grupo perceberam logo as consequências da pandemia para os grupos minoritários do país e do mundo. Sim, as desigualdades se acentuam, o desemprego deve atingir 14,5% da população brasileira economicamente ativa, e a fome passou a bater na porta de mais pessoas, mas elas olharam para além disso. O movimento resolveu se voltar para a força e a resiliência das comunidades diretamente afetadas.

“Vimos que um conjunto de ativistas negras giraram suas pautas muito rápido, na primeira semana da pandemia, para qualificar o debate sobre a pandemia, para botar luz sobre o debate dos efeitos experimentados de formas diferentes pela sociedade. Elas trouxeram todo o arcabouço que dominavam de desigualdade racial, desigualdade de gênero e muito rápido lerem os dados, mobilizaram e gritaram por mais atenção no território”, diz.

Ao perceber a movimentação, o Mulheres Negras Decidem se juntou ao Instituto Marielle Franco para documentar os desafios enfrentados pelas mulheres negras na pandemia e, mais do que isso, entender qual o caminho que essas mulheres apontam para o futuro. Elas acessaram mais de 250 ativistas negras de idades variadas, de todas as regiões e estados brasileiros. A maioria, 62% das entrevistadas, estão atuando diretamente em alguma ação de combate à Covid-19 e seus impactos. Segundo a pesquisa, as ativistas negras apontaram, como prioridades de ação no pós-pandemia, pautas que vão do fortalecimento da saúde pública e da educação básica, passando pela renda básica universal e defesa das florestas, até a efetivação do orçamento participativo.

A partir das experiências de atuação das ativistas negras, elas lançaram o relatório “Para Onde Vamos” que busca contribuir com proposições para o futuro pós-pandemia. “Vimos que não existem só medidas de entrega de alimentos e mobilização de recursos, isso é muito importante, mas esse é um momento, como as crises muitas vezes significam, de atualizar as pautas, atualizar como a gente pode sair daqui”.

A Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN) elaborada pelo Ministério da Saúde mostra a exposição das mulheres negras a situações mais precarizadas do país na área da saúde. A taxa de desemprego entre elas é de 16,6%, sendo a de homens brancos 8,3%, de mulheres brancas 11% e de homens negros 12,1%, segundo dados do PNAD contínua de 2019. Dados do Cadastro Único, destacado em publicação da ONU Mulheres e do governo brasileiro, mostram que, em dezembro de 2014, 88% de todas as famílias inscritas nos programas sociais brasileiros eram chefiadas por mulheres e 73% eram famílias negras. Entre as chefiadas por mulheres, 68% eram lideradas por mulheres negras. Já que as mulheres negras, 28% da população brasileira, são potenciais beneficiárias dos programas sociais emergenciais, por que não olhar para elas como idealizadoras e implementadoras das políticas públicas?

“As respostas à pesquisa realmente demonstram um nível alto de reflexão, mostram que essa crise não é uma crise momentânea, mas que é o momento de estruturar um projeto de Brasil, um projeto de Estado. As ativistas negras rejeitam um modelo de Estado que apenas remedie problemas ou um modelo de sociedade que abra mão de valorizar o que é essencial para vida. Elas apontam que o que deve ser priorizado é aquilo que garante a existência”, diz Ana Carolina Lourenço.
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O futuro cultivado pelas trabalhadoras rurais

Maria José Morais Costa, de Batalha (PI), mais conhecida como Mazé, 37, é agricultora familiar e Secretária de Mulheres Trabalhadoras Rurais da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura. Mazé também é coordenadora geral da Marcha das Margaridas, que em 2020 completa 20 anos.

No ano passado, a marcha reuniu quase 100 mil mulheres trabalhadoras rurais para reivindicar uma extensa plataforma política. “Construímos uma pauta a partir da demanda das mulheres dos quatro cantos desse país, fizemos encontros, seminários, caravanas, audiência pública. A partir de eixos temáticos, ouvimos qual modelo de sociedade que as Margaridas defendem. O caráter era de denúncia, de resistência e de proposição desse modelo de sociedade. O nosso lema traz isso bem forte: ”Margaridas na luta por um Brasil com soberania popular, democracia, justiça, igualdade e livre de violência”.

Neste ano, a pandemia do novo coronavírus expôs a insegurança alimentar que se espalha pelo Brasil. Mas o problema não é só da crise sanitária. Nos últimos anos, diversas políticas que aumentam a insegurança alimentar tiveram em curso no país. Uma delas são os cortes ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que garante a compra de alimentos da agricultura familiar pelo Estado e a sua doação para entidades que distribuem a comida para pessoas em situação de insegurança alimentar.

“Estamos sentido o retrocesso das políticas para a agricultura familiar, as políticas de proteção social, o aumento da pobreza e a volta do Brasil ao mapa da fome. O impacto da Covid-19 tem sido forte na vida das pessoas e quem sente de forma mais drástica essa crise são as populações que estão em situação de vulnerabilidade social, tanto na cidade, quando no campo. Quem são essas mulheres que estão em piores condições? São as que não têm acesso à terra, à água, à moradia digna, ao saneamento básico, ao emprego, aos equipamentos de saúde, de segurança pública, a uma alimentação saudável e adequada”, diz Mazé.

Um dos grandes problemas que dificultam ainda mais a vida das mulheres trabalhadoras rurais, negras e indígenas é sub-representação nos espaços de decisão política. “Você vai para o Congresso e conta com os dedos das mãos e ainda sobra dedo, não temos representantes. Nós não temos uma mulher lá que diga que é representante da agricultura familiar, temos parceiras que dialogam com a nossa pauta, mas precisamos de mulheres tanto nas Assembleias Legislativas quanto na Câmara Federal para defender o projeto político, defender essa nossa plataforma”.

Como secretária, Mazé agora constrói uma jornada formativa para pré-candidatas trabalhadoras rurais. “Só vamos conseguir mudar realmente quando virmos mulheres ocupando lugares na política partidária. Para isso, vamos precisar mexer aqui embaixo que é no município, nas câmaras e nas assembleias legislativas”.
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Força ancestral da mulher indígena

Em 1986, Eliane Lima dos Santos, conhecida como Eliane Potiguara, 70, foi uma das criadoras da primeira organização de mulheres indígenas do Brasil, a Rede Grumin de Mulheres Indígenas. A escritora e ativista acredita que houve um avanço grande nos últimos anos em relação a participação feminina indígena no debate político. “As mulheres estão à frente há muito séculos, mas houve uma grande guinada na força espiritual e ancestral da mulher indígena. Há 20, 30 anos que eu tenho falado de ancestralidade, que nós nos conectamos com as nossas forças ancestrais para que a gente possa crescer enquanto mulheres nas gestões. Assim, as mulheres vão ocupando mais espaços, como a Joênia e muitas outras estão fazendo”.

Joênia Wapichana, citada por Eliane, deputada federal pela Rede Sustentabilidade, é única parlamentar indígena do Congresso Nacional e é a primeira mulher indígena a ser eleita deputada federal. Em 2019, primeiro ano de seu mandato, foi também a primeira vez que as mulheres indígenas realizaram uma marcha em Brasília, que foi realizada junto com a Marcha das Margaridas.

“As mulheres estão se tornando cada vez mais espiritualizadas, mais ligadas na ancestralidade, mais ligada na força cósmica. Essa força tem reconhecido o sofrimento das mulheres e tem atendido essas lágrimas que as mulheres vêm derramando por todos esses séculos. Nós não tínhamos cacique mulheres, nós não tínhamos pajés, hoje temos, houve um avanço. Todo esse contexto, de inserção das mulheres, somente fortalece as comunidades, a sociedade e as crianças indígenas que estão observando que as suas mães, suas irmãs, suas avós e bisavós estão fazendo”.

A espiritualidade indígena que a Eliane Potiguara descreve também é baseada nas ideias sobre o bem viver coletivo. A conexão com a força ancestral para pautar um novo modelo de sociedade passa por descolonizar as ideias atuais sobre o que é a política. A escritora indígena Shirley Krenak, na live “Diálogos Ecumênicos e Inter-religiosos” da Coordenadoria Ecumênica de Serviço, explicou que entender a espiritualidade é ter uma visão mais longe, do futuro. “Quando os parentes estão falando, ‘não destrói os rios, não mata bicho, não polui o ar, não arrebenta com a terra’, eles estão falando da espiritualidade. Falar de espiritualidade é querer o bem do outro, é curar o outro. É através dessa conexão com a nossa espiritualidade que nós, povos indígenas, estamos defendendo o mundo hoje, para que vocês bebam água boa, para que você e seus filhos vivam bem”.
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Gabriele Roza do data_labe
Colaborou Fred Di Giacomo (edição), do data_labe
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Fonte: Ecoa/UOL


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“As mulheres negras podem e devem liderar o processo de redefinição do futuro. Elas colocam que não é porque [o mundo] é assim que sempre vai ter que ser assim”. A fala é da socióloga Ana Carolina Lourenço. As mulheres constroem, hoje, um outro futuro possível, apesar da crise iniciada pela pandemia de Covid-19, que já matou mais de 100 mil brasileiros, e foi fortalecida pela resposta ineficiente do governo brasileiro.

Assistimos, no primeiro semestre deste ano, à perda de 1, 2 milhão de empregos com carteira assinada, segundo dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), divulgados pelo Ministério da Economia. As mulheres desenham uma mudança completa, não só do sistema político, mas do pensamento sobre a organização da vida coletiva. Em um momento onde a desigualdade e o modo de produção causam ainda mais desastres, mulheres negras, trabalhadoras rurais e mulheres indígenas estão no fronte, pautando uma sociedade que tenha em sua centralidade o bem viver coletivo.

“Compartilho da ideia de que as comunidades diretamente afetadas pelos efeitos mais perversos de uma democracia falha, de um estado produtor de violências, de políticas públicas racionalmente pensadas ineficazes, em geral, são portadoras das principais respostas para enfrentar esses efeitos”, diz Ana Carolina, 30, coordenadora política do Mulheres Negras Decidem, movimento que busca fortalecer a democracia brasileira usando como estratégia a superação da sub-representação de mulheres negras nas instâncias de poder. Em abril, no segundo mês da quarentena no Brasil, ela e outras mulheres do grupo perceberam logo as consequências da pandemia para os grupos minoritários do país e do mundo. Sim, as desigualdades se acentuam, o desemprego deve atingir 14,5% da população brasileira economicamente ativa, e a fome passou a bater na porta de mais pessoas, mas elas olharam para além disso. O movimento resolveu se voltar para a força e a resiliência das comunidades diretamente afetadas.

“Vimos que um conjunto de ativistas negras giraram suas pautas muito rápido, na primeira semana da pandemia, para qualificar o debate sobre a pandemia, para botar luz sobre o debate dos efeitos experimentados de formas diferentes pela sociedade. Elas trouxeram todo o arcabouço que dominavam de desigualdade racial, desigualdade de gênero e muito rápido lerem os dados, mobilizaram e gritaram por mais atenção no território”, diz.

Ao perceber a movimentação, o Mulheres Negras Decidem se juntou ao Instituto Marielle Franco para documentar os desafios enfrentados pelas mulheres negras na pandemia e, mais do que isso, entender qual o caminho que essas mulheres apontam para o futuro. Elas acessaram mais de 250 ativistas negras de idades variadas, de todas as regiões e estados brasileiros. A maioria, 62% das entrevistadas, estão atuando diretamente em alguma ação de combate à Covid-19 e seus impactos. Segundo a pesquisa, as ativistas negras apontaram, como prioridades de ação no pós-pandemia, pautas que vão do fortalecimento da saúde pública e da educação básica, passando pela renda básica universal e defesa das florestas, até a efetivação do orçamento participativo.

A partir das experiências de atuação das ativistas negras, elas lançaram o relatório “Para Onde Vamos” que busca contribuir com proposições para o futuro pós-pandemia. “Vimos que não existem só medidas de entrega de alimentos e mobilização de recursos, isso é muito importante, mas esse é um momento, como as crises muitas vezes significam, de atualizar as pautas, atualizar como a gente pode sair daqui”.

A Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN) elaborada pelo Ministério da Saúde mostra a exposição das mulheres negras a situações mais precarizadas do país na área da saúde. A taxa de desemprego entre elas é de 16,6%, sendo a de homens brancos 8,3%, de mulheres brancas 11% e de homens negros 12,1%, segundo dados do PNAD contínua de 2019. Dados do Cadastro Único, destacado em publicação da ONU Mulheres e do governo brasileiro, mostram que, em dezembro de 2014, 88% de todas as famílias inscritas nos programas sociais brasileiros eram chefiadas por mulheres e 73% eram famílias negras. Entre as chefiadas por mulheres, 68% eram lideradas por mulheres negras. Já que as mulheres negras, 28% da população brasileira, são potenciais beneficiárias dos programas sociais emergenciais, por que não olhar para elas como idealizadoras e implementadoras das políticas públicas?

“As respostas à pesquisa realmente demonstram um nível alto de reflexão, mostram que essa crise não é uma crise momentânea, mas que é o momento de estruturar um projeto de Brasil, um projeto de Estado. As ativistas negras rejeitam um modelo de Estado que apenas remedie problemas ou um modelo de sociedade que abra mão de valorizar o que é essencial para vida. Elas apontam que o que deve ser priorizado é aquilo que garante a existência”, diz Ana Carolina Lourenço.
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O futuro cultivado pelas trabalhadoras rurais

Maria José Morais Costa, de Batalha (PI), mais conhecida como Mazé, 37, é agricultora familiar e Secretária de Mulheres Trabalhadoras Rurais da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura. Mazé também é coordenadora geral da Marcha das Margaridas, que em 2020 completa 20 anos.

No ano passado, a marcha reuniu quase 100 mil mulheres trabalhadoras rurais para reivindicar uma extensa plataforma política. “Construímos uma pauta a partir da demanda das mulheres dos quatro cantos desse país, fizemos encontros, seminários, caravanas, audiência pública. A partir de eixos temáticos, ouvimos qual modelo de sociedade que as Margaridas defendem. O caráter era de denúncia, de resistência e de proposição desse modelo de sociedade. O nosso lema traz isso bem forte: ”Margaridas na luta por um Brasil com soberania popular, democracia, justiça, igualdade e livre de violência”.

Neste ano, a pandemia do novo coronavírus expôs a insegurança alimentar que se espalha pelo Brasil. Mas o problema não é só da crise sanitária. Nos últimos anos, diversas políticas que aumentam a insegurança alimentar tiveram em curso no país. Uma delas são os cortes ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que garante a compra de alimentos da agricultura familiar pelo Estado e a sua doação para entidades que distribuem a comida para pessoas em situação de insegurança alimentar.

“Estamos sentido o retrocesso das políticas para a agricultura familiar, as políticas de proteção social, o aumento da pobreza e a volta do Brasil ao mapa da fome. O impacto da Covid-19 tem sido forte na vida das pessoas e quem sente de forma mais drástica essa crise são as populações que estão em situação de vulnerabilidade social, tanto na cidade, quando no campo. Quem são essas mulheres que estão em piores condições? São as que não têm acesso à terra, à água, à moradia digna, ao saneamento básico, ao emprego, aos equipamentos de saúde, de segurança pública, a uma alimentação saudável e adequada”, diz Mazé.

Um dos grandes problemas que dificultam ainda mais a vida das mulheres trabalhadoras rurais, negras e indígenas é sub-representação nos espaços de decisão política. “Você vai para o Congresso e conta com os dedos das mãos e ainda sobra dedo, não temos representantes. Nós não temos uma mulher lá que diga que é representante da agricultura familiar, temos parceiras que dialogam com a nossa pauta, mas precisamos de mulheres tanto nas Assembleias Legislativas quanto na Câmara Federal para defender o projeto político, defender essa nossa plataforma”.

Como secretária, Mazé agora constrói uma jornada formativa para pré-candidatas trabalhadoras rurais. “Só vamos conseguir mudar realmente quando virmos mulheres ocupando lugares na política partidária. Para isso, vamos precisar mexer aqui embaixo que é no município, nas câmaras e nas assembleias legislativas”.
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Força ancestral da mulher indígena

Em 1986, Eliane Lima dos Santos, conhecida como Eliane Potiguara, 70, foi uma das criadoras da primeira organização de mulheres indígenas do Brasil, a Rede Grumin de Mulheres Indígenas. A escritora e ativista acredita que houve um avanço grande nos últimos anos em relação a participação feminina indígena no debate político. “As mulheres estão à frente há muito séculos, mas houve uma grande guinada na força espiritual e ancestral da mulher indígena. Há 20, 30 anos que eu tenho falado de ancestralidade, que nós nos conectamos com as nossas forças ancestrais para que a gente possa crescer enquanto mulheres nas gestões. Assim, as mulheres vão ocupando mais espaços, como a Joênia e muitas outras estão fazendo”.

Joênia Wapichana, citada por Eliane, deputada federal pela Rede Sustentabilidade, é única parlamentar indígena do Congresso Nacional e é a primeira mulher indígena a ser eleita deputada federal. Em 2019, primeiro ano de seu mandato, foi também a primeira vez que as mulheres indígenas realizaram uma marcha em Brasília, que foi realizada junto com a Marcha das Margaridas.

“As mulheres estão se tornando cada vez mais espiritualizadas, mais ligadas na ancestralidade, mais ligada na força cósmica. Essa força tem reconhecido o sofrimento das mulheres e tem atendido essas lágrimas que as mulheres vêm derramando por todos esses séculos. Nós não tínhamos cacique mulheres, nós não tínhamos pajés, hoje temos, houve um avanço. Todo esse contexto, de inserção das mulheres, somente fortalece as comunidades, a sociedade e as crianças indígenas que estão observando que as suas mães, suas irmãs, suas avós e bisavós estão fazendo”.

A espiritualidade indígena que a Eliane Potiguara descreve também é baseada nas ideias sobre o bem viver coletivo. A conexão com a força ancestral para pautar um novo modelo de sociedade passa por descolonizar as ideias atuais sobre o que é a política. A escritora indígena Shirley Krenak, na live “Diálogos Ecumênicos e Inter-religiosos” da Coordenadoria Ecumênica de Serviço, explicou que entender a espiritualidade é ter uma visão mais longe, do futuro. “Quando os parentes estão falando, ‘não destrói os rios, não mata bicho, não polui o ar, não arrebenta com a terra’, eles estão falando da espiritualidade. Falar de espiritualidade é querer o bem do outro, é curar o outro. É através dessa conexão com a nossa espiritualidade que nós, povos indígenas, estamos defendendo o mundo hoje, para que vocês bebam água boa, para que você e seus filhos vivam bem”.
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Gabriele Roza do data_labe
Colaborou Fred Di Giacomo (edição), do data_labe
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Fonte: Ecoa/UOL