Combate à Fome em FOCO | Análises e Estudos
Alimentos com alto poder nutricional; pesquisa da UEPA aponta exemplos da Amazônia
Por: Emanuele Corrêa
As chamadas “comidas poderosas” têm grande concentração de proteínas, vitaminas, minerais, fibras, antioxidantes e outros compostos essenciais para boa saúde
As “comidas poderosas” ou “alimentos de alto poder nutritivo” estão ganhando destaque devido à possibilidade de uma melhora na saúde e qualidade de vida. Estes alimentos de alta performance podem também auxiliar no combate à desnutrição e fome, se estabelecidos em comunhão com políticas públicas de segurança alimentar. A Universidade do Estado do Pará (Uepa) realiza estudos no Laboratório de Tecnologia e Análise de Alimentos, do Campus Castanhal, sobre a elaboração de produtos alimentícios com características de alimentos não convencionais e grandes propriedades nutricionais.
Alimentos com alta concentração de proteínas, vitaminas, minerais, fibras, antioxidantes e outros compostos importantes para o funcionamento do corpo podem ser chamados de “comidas poderosas”, é o que explica o engenheiro de alimentos Adriano Calandrini Braga, que também é doutor em ciência e tecnologia de alimentos.
“São aqueles com composição rica e diferenciada quando comparados a outros alimentos ‘convencionais’. Estudos atestam os benefícios destes insumos. O nutricional é apenas uma vertente, pois esses compostos estão relacionados também à prevenção de doenças como as cardiovasculares. No geral, o benefício nutricional desses alimentos está muito associado com os níveis elevados de antioxidantes e outros compostos bioativos presentes neles”, ressaltou o professor.
Uma das pesquisas realizadas no Laboratório de Castanhal da UEPA analisou os benefícios da acerola, não só para o consumo como suco, mas em outras fabricações. “Em uma delas, avaliamos a composição do resíduo da acerola e notamos uma grande quantidade de compostos bioativos ainda presentes. Usamos esse resíduo na elaboração de pães e biscoitos tipo amanteigados e os resultados indicaram teores significativos desses compostos, além de boa aceitação do ponto de vista sensorial”, disse.
Em outra pesquisa, destacou Caladrini, foi desenvolvida uma bebida mista à base de goiaba, cupuaçu e pitaya. A composição em termos de bioativos, teve bons valores de antocianinas, vitamina C e carotenoides, o que faz com que ela possa ser indicada como um poderoso alimento.
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Açaí é dos poderosos alimentos da Amazônia
Os alimentos não convencionais estão mais próximos da mesa do paraense. Como exemplo de alimentos que contêm propriedades benéficas à saúde, está o açaí, rico em compostos antioxidantes, que exercem esses efeitos benéficos ao organismo.
A nutricionista Thais Granado, mestre em gestão e saúde, destaca os benefícios, valor nutricional e poder de combater algumas doenças que o açaí tem. “É rico em antocianinas, possui alto valor nutricional e capacidade antioxidante. Atua no combate a doenças cardiovasculares e neurodegenerativas, além de apresentar benefícios como a redução de transtornos gastrointestinais e do colesterol. Pesquisa recente realizada na UFPA apontou o alto potencial probiótico do açaí”, revelou.
Outros alimentos conhecidos pelos paraenses estão nessa lista de comidas poderosas: pupunha e abacaxi. Mas há um grupo menos conhecido, as Plantas Alimentícias Não Convencionais (PANC). O jambu é um exemplo de PANC. Outras são Ora-pro-nóbis e peixinho da horta, que de maneira geral, também fornecem nutrientes: fibras, vitaminas e minerais que são importantes para o organismo, pontua Thais.
“A alimentação é mais do que a simples oferta de nutrientes. Envolve a partilha, o prazer de comer, os afetos, o acesso aos alimentos. Os alimentos [poderosos] oferecem benefícios, mas não podemos focar apenas nos nutrientes isolados. Segundo o artigo 3° da Lei 11.346 de 2006, Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis”, destacou.
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Combate à insegurança alimentar
No caso específico do combate à fome, é preciso garantir a segurança alimentar – superação de todas as dimensões que promovem a ocorrência da fome – para as pessoas que estão em vulnerabilidade socioeconômica, por meio da ação da sociedade e políticas públicas, afirma o engenheiro de alimentos Adriano Calandrini Braga. Ele ressalta que não se deve correlacionar diretamente a questão do consumo dos alimentos com alto poder nutritivo, com o combate à fome. No entanto, diz que uma vez que se garanta a segurança alimentar, o uso destes alimentos na dieta dessas populações poderá trazer benefícios.
Em Belém, a Coordenação das Políticas de Segurança Alimentar e Nutricional (Copsan) já levou mais de 3 mil cestas básicas, só no ano de 2021, às famílias que vivem em situação de vulnerabilidade social com o projeto “Cesta nutrir juntos”, que toda sexta-feira leva alimentação adequada aos atendidos do comitê Arte Pela Vida, Comissão da Diversidade Sexual (CDS) e Coordenadoria Antirracista (Coant), que atende pessoas pretas e indígenas.
Merilene Silva Costa, coordenadora de políticas de segurança alimentar e nutricional da Copsan, conta que desde junho de 2021 atuam no combate ao desperdício de alimentos. “Nosso desafio está em combater a exclusão social e a fome. Nós estamos pretendendo ampliar e buscar essa vulnerabilidade de uma forma macro. Vamos atuar na soberania alimentar”, explicou.
Rosângela Quintela, cientista social da Copsan, explica que há sensibilização junto a 30 permissionários da Ceasa para captar a doação dos alimentos. “Hoje eles já dão parte do que planejamos, do que eles acham que não vai vender tanto. Trabalhamos o desperdício de alimentos (recebendo as frutas que poderiam ser desperdiçadas sem a venda) e a fome (levando esses insumos a quem está em vulnerabilidade social)”, explicou.
As frutas, legumes, verduras e hortaliças doadas pelos microempreendedores da Ceasa passam por higienização e separação, para compor as cestas que serão entregues às 70 famílias. A primeira parada é no espaço do comitê Arte Pela Vida.
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Atendidos por programa da Prefeitura de belém falam sobre dignidade e amparo no combate à fome
Uma das pessoas atendidas é o José Pinheiro, que se emociona ao falar do projeto. Para ele, além dos alimentos, o tratamento humano é o mais importante. “O mais importante de tudo não é o conteúdo físico, mas sim, o tratamento humano. Nos sentimos valorizados como cidadãos. Além de bem assistidos, com ótimos alimentos”, arguiu.
Davi Xakanywa, 26 anos, veio do Amazonas ao Pará e reside há três anos com a esposa e as duas filhas em Belém para estudar medicina na UFPA e é atendido pela Coant. Ele explica que por ser estudante indígena, os desafios que envolvem a alimentação da sua família são maiores. “Muitas vezes nós, indígenas, não temos renda, por sermos estudantes, passamos o dia fora de casa. Eu tenho duas filhas que ficam em casa, não têm apoio. Esse projeto me ajudou a alimentá-las. Através desses nutrientes que proporcionam qualidade de vida para mim e meus parentes”, comentou.
Jéssica Marajoara, 38 anos, recebe as cestas do nutrir juntos e destaca que a população transexual ainda tem dificuldades de acesso a renda e alimentação. O projeto vem proporcionar essa dignidade. “Se for para tirar do nosso bolso uma cesta orgânica como essa, não teríamos condições. São frutas de boa qualidade, veio para somar na minha saúde”, disse.
Fonte: O Liberal