Mesmo com medidas de segurança, profissionais enfrentam riscos de contaminação

Atualizado em 23/11/2020

Ainda que adotem todas as medidas de proteção contra a infecção pelo novo coronavírus, profissionais enfrentam riscos e os receios de contaminação durante a rotina de trabalho. Infectologista explica por que alguns ambientes oferecem mais perigo de contágio

O Distrito Federal está há oito meses na batalha contra a covid-19, entre medidas de contenção, isolamento social e flexibilização das atividades ao longo dos meses. Na luta diária, médicos, enfermeiros e infectologistas encararam os riscos de contaminação de frente para melhor atender e dar suporte aos pacientes com a doença. No entanto, outras profissões também oferecem perigos de infecção na rotina de trabalho. A infectologista Ana Helena Germoglio explica porque alguns ambientes são mais propensos à exposição da covid-19 do que outros.

Para Ana Helena, a forma e o tipo de exposição que cada pessoa tem em relação ao novo coronavírus influenciam nas chances de contágio. “Isso depende muito. Os médicos e os profissionais que atuam na área da saúde diretamente com pacientes com covid-19, e dentistas que trabalham com procedimentos utilizando aerossol, que ocasionam uma propagação do vírus no ar, vão ter um risco maior do que um ortopedista, por exemplo”, conta. Fora da ala hospitalar, a possibilidade está relacionada também ao ambiente, como espaço com aglomeração e locais fechados. “Em bares, onde as pessoas se aglomeram sem máscara, no transporte público ou por aplicativo, o perigo é mais alto”, pontua.

“Qualquer profissão que tenha contato muito próximo com pessoas, em ambientes fechados ou aglomerados tem um potencial de contaminação”, analisa. Por outro lado, as atividades ao ar livre e em escritório sem atendimento ao público oferecem menos risco, se a pessoa seguir os protocolos de higienização e proteção, como o uso de máscara facial e álcool em gel 70%. De acordo com a infectologista, o tempo médio para uma pessoa se contaminar é de 15 a 20 minutos ao lado de alguém com o vírus ativo.

O receio de contrair a doença faz parte do dia a dia de André Henrique da Silva, 34 anos. O cobrador, que atua nas linhas circulares do Plano Piloto, conta que é comum ver colegas da profissão sendo contaminados. “Uma vez, eu pensei que estava com a covid-19. Fiz o exame e deu negativo. Mas, no nosso meio, é constante ver pessoas que foram infectadas, que se recuperaram, e tem aqueles que, infelizmente, faleceram pela doença”, comenta o morador de Valparaíso.

“Qualquer pessoa que esteja trabalhando hoje, na rua, corre sério risco de ser contaminada, independentemente da função. Lógico que a gente (rodoviários) pode ter um pouquinho mais de risco, porque lida com o público em geral. Nosso meio é complicado”, conta André. Os dias de chuva, com as janelas fechadas, ele avalia como sendo os mais críticos. Para ele, o importante é continuar os cuidados de proteção. “E esperar que haja uma vacina para a gente viver de uma forma mais tranquila”, afirma o cobrador.

Na avaliação de Ademar Rodrigues, 52, que está desde 1984 atuando como motorista de ônibus, a conscientização da população e os cuidados com o vírus estão maiores do que no início da pandemia. “No começo, as pessoas tinham resistência a usar a máscara. A gente pedia para colocá-la, e elas achavam ruim, brigavam, diziam que era besteira. E, hoje em dia, não vejo mais isso”, comenta Ademar. Ele contraiu o vírus nos primeiros meses de pandemia na capital, enquanto trabalhava.
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Protocolos

Para o garçom Murilo Ferreira Bisco, 34, mesmo lidando com clientes sem máscara durante a entrega de bebidas e petiscos em um bar na Asa Sul, os protocolos de prevenção têm proporcionado um pouco mais de segurança. “Receio todo mundo tem, mas a gente está seguro com o que a empresa nos fornece. E, também, sempre tento manter o distanciamento do cliente na mesa”, destaca. O gerente do estabelecimento conta que o local disponibiliza totens de álcool em gel, espalhados pelo espaço, medição de temperatura e uso de máscara pela equipe e pelos clientes enquanto circulam no estabelecimento.

A dentista Sheila Campos de Oliveira, 47, conta que seguir as medidas de assepsia e proteção é essencial para a segurança tanto do profissional quanto dos pacientes. “É preciso ter essa consciência e percepção. Estamos lidando com a vida de alguém e a nossa também”, ressalta. Na clínica, o cliente tem de lavar o rosto e as mãos antes de entrar no consultório. Se estiver com algum sintoma gripal, o recomendado é retornar em outro momento. O espaço é limpo rigorosamente e todos os equipamentos de proteção individual (EPIs) são trocados a cada atendimento. Para ela, o processo de adaptação não foi fácil, mas, se for seguido da forma correta, ela analisa que os profissionais da odontologia estão preparados.
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Duas perguntas / Leandro Machado, infectologista

Na sua avaliação, como está o cenário pandêmico na capital?
Estamos em um platô, onde há variação de casos e os hospitais não estão cheios igual antigamente. Mas a gente vem percebendo, e isso é sensível para quem trabalha na ponta, que os números estão aumentando. As internações estão aumentando, então, se continuar nessa tendência, a gente terá um novo pico. Uma nova onda.

Quais as medidas necessárias para evitar uma eventual segunda onda?
As únicas medidas eficazes são o isolamento de forma consciente e o uso de equipamento de proteção individual. Já temos um estudo que mostra que existe a transmissão do vírus pelo ar. E quando se tem transmissão pelo ar, o que protege é a máscara PFF2, utilizada em hospitais. A gente precisa repensar a máscara de pano; o uso dela foi colocado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em tempo de isolamento, caso a pessoa precisasse sair de casa. Só que agora a gente está liberando a população para rua, usando a máscara de pano mesmo sabendo que ela não é eficiente. Vamos ter um número maior de infecção por conta disso.
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Fonte: Correio Braziliense