As novas regras do flerte em tempos de pandemia

Atualizado em 7/8/2020

Entre as medidas de distanciamento, especialistas destacam um “protocolo” seguro de aproximação

Depois deste ano, flertar será mais estranho do que nunca. Alcançar o difícil equilíbrio entre proteger-se e desfrutar os prazeres eróticos parece ser a meta, mas combinar o uso de máscaras, o distanciamento seguro e a aproximação íntima de novos amigos parece impossível. Não é preciso ir muito longe para encontrar exemplos: experiências como um simples beijo podem ser muito sexuais e desencadear os processos fisiológicos que acompanham a excitação, mas, como diz Francisca Molero, médica, sexóloga clínica e presidente da Federação Espanhola de Sociedades de Sexologia, “neste momento, beijar uma pessoa que acabamos de conhecer é totalmente desaconselhável”. E o que conta com a aprovação dessa especialista?

A covid-19 mudou muitas coisas e inevitavelmente reformulará o que é conhecido como pular de galho em galho. “Os rituais terão que ser transformados”, acrescenta a sexóloga. “Antes da pandemia, as interações amorosas haviam mudado e muitas pessoas começavam um relacionamento romântico já por meio do sexo; se funcionasse, elas se davam a chance de continuar se conhecendo. Agora, vão precisar se sentir mais seguras para se tornarem íntimas.” E como? “Deve ser compensado com a comunicação visual, e não verbal”, diz Molero. “O olhar, os gestos terão muita importância erótica … Pode ser que passemos a dar mais espaço à sedução, àquela comunicação erótica que não é corporal. Mais à moda antiga? Certamente”.

Manter a distância interpessoal não impede que se tenha muito tato ao iniciar as manobras de sedução. O objetivo ainda é atrair a outra parte… e não espantá-la. Portanto, cuidado com as medidas de higiene. São necessárias, mas você precisa saber como pedi-las. Dizer de cara a alguém que tem que ir lavar as mãos pode fazer a pessoa ir, sim, mas não voltar. Para administrar a situação, a primeira coisa a fazer é lembrar-se de que você se ama muito. “Quanto mais autoestima a pessoa tem, mais ela se cuida”, diz a psicóloga Miren Larrazábal. “Uma vez assimilado, devemos expressar isso diretamente e sem rodeios, sabendo que estamos reivindicando um direito. Você pode dizer assim: ‘Nós vamos estar bem melhores, você e eu.’ Mesmo assim, como faziam as mulheres na época das campanhas publicitárias para convencer o homem a colocar a camisinha, você pode oferecer o seu próprio álcool em gel. É conveniente ser proativo.”

Quanto à máscara, causaram surpresa as diretrizes divulgadas pelo Departamento de Saúde de Nova York em 8 de junho, entre as quais consta a recomendação de uso desse elemento de proteção durante o sexo. Se você é um dos que se espantaram, considere que, segundo Francisca Molero, “tem que estar presente, é óbvio”: incorpore-a com imaginação no jogo erótico, como um véu ou disfarce. O guia também recomenda que as pessoas que tiveram diferentes parceiros sexuais se submetam a testes mensais ou de cinco a sete dias após cada encontro.

A normalidade do sexo a dois metros

O contato físico com a nudez de outra pessoa, um dos estímulos do sexo no casal, entra em conflito com os famosos dois metros de separação. Mas existem práticas que podem substituir a clássica fricção dos corpos e são, segundo Molero, igualmente agradáveis. “Sexo virtual também é sexo, e pode ser uma alternativa por meio de mensagens que criam essa intimidade e, a partir daí, se você tiver mais confiança, decidir se pode se permitir a parte presencial. E também, brincar de pedir à outra pessoa que faça tal ou qual coisa enquanto olhamos; e a masturbação, é claro.”

É melhor isso do que ficar perguntando sobre o histórico amoroso recente da pessoa ou querer ver exames médicos, como se o coronavírus fosse uma DST. “De todo modo, é bastante inútil, porque pode ser que você não tivesse covid uma semana antes, quando fez o teste, mas depois se contagiou. Aqui, as únicas medidas são a prevenção e a vacinação, quando existir”, diz Molero. A psicóloga Miren Larrazábal considera que perguntar ou pedir provas “nessa situação não garante nada, porque a pessoa poderia ter se contagiado mais tarde em uma reunião.”

É por isso que a psicóloga também defende o resgate de práticas menos frequentes, assumindo que isso será apenas por um tempo. “Essa nova normalidade também é uma nova sexualidade, embora transitória”, diz ela. “E, portanto, devemos tomar medidas excepcionais e ser mais criativos. Podemos praticar a masturbação juntos, mantendo a distância de segurança. Tudo isso temos que incorporar ao nosso repertório de comportamentos sexuais e devem ser os mais frequentes enquanto durar esse estado excepcional “.

Existe a transmissão sexual?

Estudos sobre a presença do coronavírus no esperma são contraditórios. A prestigiada Clínica Mayo resume assim a questão: “No momento, não há evidências de que a covid seja transmitida por sêmen ou fluidos vaginais, mas o vírus foi detectado no sêmen de pessoas que se recuperaram, ou estão se recuperando do vírus. Mais pesquisas serão necessárias para se determinar se a covid pode ser transmitida sexualmente”.

Além dos dois metros de separação, as autoridades de saúde observam que deve haver um contato superior a 15 minutos para que seja considerado de risco. O mundo mudará tanto neste verão a ponto de levar embora o sexo rápido? “Na realidade, não se deve brincar com os 15 minutos”, diz Francisca Molero, “porque pode ser que o tempo passe voando e você não se dê conta, e não é o caso de ficar checando o relógio para vigiar a duração da exposição. As recomendações teóricas são excelentes e baseadas em evidências, mas, na prática, é difícil. É mais fácil ter em mente o distanciamento seguro.”

Em suma, como afirma a sexóloga, “não é o verão para ser promíscuo” ―no caso da Europa. Mas também não é o caso de pôr um limite ao número de amantes. “Se os relacionamentos se baseiam em sexo virtual, sedução e medidas seguras, as pessoas podem ter muitos.”

Fonte: El País