Se você quer ir a um restaurante na pandemia: o que precisa saber e fazer

Atualizado em 7/10/2020

Para muita gente, o confinamento já não está descendo. E essa é uma realidade com a qual precisamos lidar. Alguns dizem: a vida está lá fora. Só que — opa! —o vírus também. Portanto, não estou falando que é para todo mundo sair como se não houvesse uma pandemia, lotando calçadas de bares e filas de espera. Tampouco quero estragar os seus planos, se já começou a ficar com a boca cheia d’água só de se lembrar daquele seu prato favorito. Mas a pandemia continua, sim — firme e apenas um pouco menos forte. Como conciliar?

O fato é que muitas atividades voltaram, as pessoas estão nas ruas. Às vezes, têm necessidade mesmo, pensando nos que trabalham fora. Outros, porém, têm desejo, o tão humano desejo. A pergunta que fica então: dá para ir a um restaurante sentindo-se seguro quase como se estivesse à mesa de casa?

Em agosto passado, o InCor (Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP) criou uma iniciativa, a Chancela InCor, para ajudar empresas que queriam abrir suas portas ao público em um modo, digamos, mais protegido — como escolas, hotéis, teatros e, claro, restaurantes.

Quem coordena o projeto é o cardiologista Sérgio Timerman e não consigo pensar em nome melhor. Além de diretor do Laboratório de Treinamento e Simulação em Emergências Cardiovasculares do mesmíssimo InCor, ele é um notório apreciador de vinhos e da boa gastronomia. É tão querido entre os chefs da cidade que conseguiu que alguns mandassem marmitas para animar os enfermeiros na linha de frente do instituto, no auge das internações por covid-19 — doença que ele próprio contraiu e que relata de maneira impressionante. Por isso, diz: “O ‘cliente’ Sérgio Timerman, que sabe bem como é essa infecção e como deveriam ser as coisas nos restaurantes, às vezes se aborrece com o que vê por aí”.

Pergunto o que ele faz, então, em uma hora de aborrecimento. ‘Se o problema é com o funcionário ou se sinto a falta de algo, explico o que o deveria ser feito com educação e, quando há interesse, até converso com o responsável, passando de coração algumas dicas, porque sei que estabelecimentos menores dificilmente chamarão o InCor para um chancela”, conta. “No caso de um cliente que se comporta de uma maneira errada, chamo alguém do restaurante e peço que interfiram, quando noto que a pessoa não tem má fé, está distraída ou não sabe como agir. No entanto, infelizmente a gente vê por aí indivíduos que colocam a vida de todos em risco por pura provocação mesmo. E isso é horrível”.
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Encontre pistas dos cuidados que você não tem como ver

No InCor, o primeiro passo para um estabelecimento ganhar a sua chancela é mandar o seu protocolo de segurança, com tudo aquilo que faz e o que não faz para evitar a covid-19. A equipe médica o analisa em busca de ajustes ou, se for o caso, refaz tudo. Daí é realizada uma visita, todos tiram dúvidas e, tempos depois, a rotina é checada para ver se está de acordo.

Claro que existem detalhes que não tem como você saber. Exemplo: “Se o fornecedor chega com produtos em engradados, eles não devem entrar. Cada item deve ser transferido para os engradados higienizados do próprio restaurante antes”, explica o médico. Pois é… Mas como saber?

O jeito é reparar se pelo menos aquilo que está bem diante dos seus olhos parece correto. “Uma pista é que tudo deve ser higienizável: cadeiras, mesas, pisos, objetos”, explica Sérgio Timerman. Ou seja, algo que não pode passar por limpeza a todo instante — vamos imaginar, o tecido de uma cadeira — deveria ter sido substituído ou encapado.
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“A sua mesa está pronta”

Sabe essa história de esperar até ouvir que a mesa está pronta? Antes isso significava passar um pano para limpá-la, tirar as migalhas do cliente anterior, trocar a toalha e dispor copos, pratos… Agora não! “Mesa pronta é mesa muito bem higienizada entre um cliente e outro”, avisa o doutor. Tem mais: estranhe se a louça já estiver já, bonitinha, lhe aguardando. “Para evitar a infecção, pratos, copos, talheres e guardanapos devem ser oferecidos com proteção e só quando o cliente já estiver sentado”, ensina.
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Mudança no cardápio

O velho cardápio de papel, capa de plástico ou de couro, pode ser foco de contaminação. Pense: todo mundo bota as mãos ali. Por isso, os protocolos de segurança mandam que os cardápios passem a ser impressos em materiais higienizáveis ou, ainda melhor, se tornem on-line, com o cliente podendo baixá-lo por meio de QR-code.
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Álcool para todos

Não basta disponibilizar o álcool em gel só na entrada dos lugares, no lobby e no balcão. “Todos os protocolos internacionais são claros: cada mesa precisa ter um dispenser dele”, avisa Sérgio Timerman.

Lembre-se sempre que higienizar as mãos e manter a distância física é a melhor maneira de se proteger. E ter o álcool à mesa facilita não só a higiene, mas evita que você precise se levantar para ir até a pia do banheiro — que deve ter toalhas descartáveis e nada diferente disso para secar as suas mãos — ou que fique chamando o garçon para ver se ele pode trazer o gel.

“Quanto menos contato você tiver com funcionários, com outros clientes, com quem for, será melhor”, adverte o doutor Timerman. Ou seja, a ideia implícita aqui é a seguinte: entre, sente-se no seu canto e não fique transitando pelo ambiente ou chamando quem está atendendo a todo instante.

Um detalhe importante sobre o álcool em gel: os restaurantes costumam comprá-lo a granel. Então, quando é assim, o dispenser deve informar a procedência e, muita atenção, a data de validade. Sim, o álcool em gel tem data de validade. Quando ela expira, o produto pode até continuar com o cheirinho de álcool, mas não conte com aqueles 70% e com seu poder de destruir o novo coronavírus. Aliás, já olhou para a validade do seu álcool em gel?
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O uso de face shields

De acordo com os protocolos do InCor, qualquer pessoa que entrar em contato com os clientes — garçons, recepcionistas… — precisará vestir não só máscaras como as benditas face shields sobre elas, o que, cá entre nós, a gente não vê muito por aí. “Mas devemos começar a cobrar”, recomenda o cardiologista.

E aqui vai mais um conselho do doutor Sérgio Timerman: “Note se não há marcas de dedos no material transparente da face shield”. O médico explica que muita gente acaba levantando essa parte, a viseira, ao falar com o cliente. Errado. Sem contar que, se as digitais estão ali, o equipamento de proteção não deve estar sendo higienizado com esmero diariamente, como seria de lei. De quebra, isso pode ser a ponta do iceberg do descuido — ora, se ninguém está zelando pela face shield, imagine só o resto!
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Máscaras para todos

O restaurante deve disponibilizar máscaras para os funcionários, atentando para o número exigido de trocas — trocas que valem para os clientes também. Lembre-se: a eficácia de uma máscara de pano vai para o beleléu duas ou três horas depois. No caso das cirúrgicas, elas duram, quando muito, cinco ou seis horas.

E mais respeito com o outro, por favor: os protocolos do InCor e os internacionais são claros na orientação de que os clientes devem usar máscara durante todo o período em que permanecerem no local, com exceção daqueles momentos em que estiverem comendo ou bebendo, claro. Mas, aí, sempre sentados à sua mesa.

“O restaurante deve fornecer um saquinho de papel, por exemplo, para a máscara ficar guardada sobre a mesa e nunca, no bolso”, diz Sérgio Timerman. “Quando você quiser se levantar por qualquer motivo, seja para fazer xixi ou para acender um cigarro do lado de fora, já precisará estar usando máscara”, informa.
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Nada de luvas

“Usar luvas em restaurantes é um erro”, aponta ainda o cardiologista. “O novo coronavírus pode se acumular nelas muito mais do que em suas mãos só de você pegar no celular, vamos supor. Daí ele será facilmente transmitido quando você tocar o rosto”, explica o médico. “É muito melhor higienizar as mãos regularmente”, assegura o doutor.
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Aglomerações caem muito mal

Não dá para conceber lugares lotados. Não à toa, as mesas precisam ter de 1 a 2 metros de distância. E — ah, sim — todos concordam que, quanto mais arejado for o local, menor será o risco de contrair o novo coronavírus. Por isso o aviso de que mesas em áreas externas são melhores.

Isso, porém, não significa que as pessoas possam circular por áreas externas como em festinhas — antes da pandemia, pelo amor! — dentro de casa. Sentar-se em uma mesa externa é bem diferente de ficar em pé, bebendo, beliscando e, às vezes, fumando.

Quando há espera para entrar, de acordo com os protocolos de segurança, as pessoas também devem manter a distância física e ficar, de preferência, sentadas e de máscara. “Não porque seja mais fácil passar o vírus se estiverem de pé, mas porque aí a tendência é ninguém parar quieto e começar a circular”, esclarece Sérgio Timerman. Vale lembrar que a via é pública. Se alguém está nela consumindo e sem máscara, formando um corredor polonês de coronavírus, não é caso de falar com o restaurante — aí já seria caso de polícia mesmo
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Depois do almoço

Chegando em casa, garante Sérgio Timerman, não há tanta urgência para tomar banho, nem para trocar de roupa — como se falou no início da pandemia. “Pureza é uma virtude, paranoia não!”, brinca o doutor. Mas, evidente, vá correndo lavar bem as mãos, como deve fazer depois qualquer saída.

Talvez, como eu, você hesite e se pergunte se o programa de ir a um restaurante é seguro depois de tantos cuidados. “Com esses cuidados, ele é mais seguro, mas nunca é 100%”, reconhece o cardiologista, que desdenha selos e certificações como “covid-free”. “Isso de estar livre do novo coronavírus não existe, nem sequer dentro de casa muitas vezes. Mas a ideia é justamente esta: zelar por todas essas medidas para que a segurança desses passeios pelo menos se aproxime daquela que se tem no confinamento no próprio endereço”, diz.

Também acho que é difícil encontrar um lugar para comer que siga toda essa cartilha — embora ela seja pra lá de necessária. O jeito é, logo na porta, observar o básico, como se estão checando se quem deseja entrar tem sintomas de infecção, se é um local ventilado, se as mesas são distantes, se funcionários estão com máscara e face shield. E, então, aprender a cobrar o resto. Sim, cobrar com jeitinho e sem se acanhar. É um direito seu, se quiser recuperar um mínimo de normalidade com máxima segurança.
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Por: Coluna da Lúcia Helena

Fonte: Viva Bem/UOL