Dados do SUS revelam vítima-padrão do Covid-19 no Brasil: homem, pobre e negro

Atualizado em 5/7/2020

Levantamento inédito mostra perfil dos brasileiros que perderam a vida em maior número por causa da pandemia. Em comum, eles têm a cor, a idade e a falta de oportunidades

Adelson José da Silva, de 67 anos, morreu em decorrência da Covid-19 no dia 5 de maio. Ele era pardo, havia cursado até o ensino médio e vivia em área urbana. Essas características, somadas à idade e à presença de ao menos uma comorbidade, diabetes, o colocam no grupo em que, segundo dados coletados no Sistema Sivep-Gripe, do OpenDataSUS, mantido pelo Sistema Único de Saúde, está a vítima-padrão da Covid-19 no Brasil.

Um levantamento exclusivo encomendado por ÉPOCA à consultoria Lagom Data, em que foram analisados dados de 54.488 vítimas, mostra o que dizem os mortos sobre a pandemia no Brasil. A conclusão é que, por razões socioeconômicas e sociodemográficas, a doença matou mais pobres e pardos, mais homens que mulheres e mais jovens do que em outros países onde a pandemia inviabilizou sistemas de saúde, como na Itália e na Espanha.

Por meio do Sistema Sivep-Gripe, é possível ler o que cada profissional da saúde escreveu na ficha de cada paciente infectado pelo novo coronavírus no Brasil. A inserção tem uma certa defasagem: na terça-feira 30, última coleta feita pela reportagem, eram contabilizadas 54.488 mortes, enquanto os números do Ministério da Saúde estavam em 60 mil.

Regiões brasileiras apresentam diferenças na composição racial dos mortos pela Covid-19

­ Foto: Dados do Brasil: Sivep Gripe / Opendatasus
Foto: Dados do Brasil: Sivep Gripe / Opendatasus

Sexo, idade e localização são as informações mais completas nas fichas pesquisadas. Com isso, é possível saber que 96% dos pacientes que morreram de Covid-19 após serem internados no Brasil viviam em zonas urbanas e quase seis em cada dez eram homens. A cor da pele é preenchida em cerca de dois terços das fichas e, apesar das lacunas, os números evidenciam o impacto da desigualdade.

Das vítimas cuja cor foi identificada, 61% constam como pardas e pretas, enquanto, segundo o IBGE, os pardos e pretos no país representam 54%. No Norte, 86% das vítimas eram pardas e pretas, um número proporcionalmente maior do que a desses fenótipos na população da região — que é de 76%. No Nordeste, eram 82% dos mortos, mesmo sendo apenas 70% da população, de acordo com o IBGE.

“OS DADOS DO SUS MOSTRAM QUE, POR RAZÕES SOCIOECONÔMICAS E SOCIODEMOGRÁFICAS, A COVID-19 MATOU MAIS POBRES E PARDOS, MAIS HOMENS QUE MULHERES E MAIS JOVENS DO QUE EM OUTROS PAÍSES ONDE A PANDEMIA INVIABILIZOU SISTEMAS DE SAÚDE”

Ao analisar a média de idade das vítimas, o levantamento mostra importantes oscilações entre os estados — em Mato Grosso, 40% dos mortos tinham menos de 60 anos, enquanto no Rio Grande do Sul apenas 21% estavam nessa faixa —, e também que os brasileiros morreram mais jovens na comparação internacional.

No Brasil, a média para mulheres é de 70 anos e para os homens de 67. Mas, quando se observa as idades por categorias, há maior percentual de vítimas mais jovens do que a média de países europeus. No Brasil, cerca de 6% das vítimas tinham entre 40 e 49 anos, enquanto em países como Itália, Espanha e Suécia, esse porcentual não passou de 1%.

Já entre 50 e 59 anos, os brasileiros que morreram em decorrência da pandemia superavam 10% do total. Nos três países europeus, as vítimas nessa faixa etária eram menos de 5%. Na Espanha e na Itália, 40% das vítimas tinham entre 80 e 90 anos. No Brasil, essa faixa correspondia a cerca de 20% dos mortos. Nos Estados Unidos, 19% dos mortos tinham menos de 65 anos. No Brasil, 26% tinham menos de 60 anos.

Fonte: Época