Coronavírus: a carga viral dos pacientes e os riscos para profissionais de saúde

Atualizado em 14/4/2020

Na luta contra o coronavírus, os profissionais de saúde de todo o mundo estão pagando um preço alto.

Milhares contraíram o covid-19, e o número de mortes continua subindo entre eles.

Apesar do uso de roupas e máscaras protetoras, médicos, enfermeiros e outros profissionais de saúde parecem ter uma tendência maior à infecção do que a maioria das pessoas. E, possivelmente, tenham mais chance de ficarem gravemente doentes.

Mas por que eles estão ficando tão doentes?

Carga viral
De acordo com especialistas, parte da explicação para essa questão está na quantidade de vírus a que as equipes médicas são expostas.

Uma vez que o vírus entra no corpo, ele invade as células e se replica. Essas cópias se acumulam durante os dias seguintes, o que faz o paciente ter mais e mais vírus dentro dele.
Uma “carga viral” mais alta – como é conhecida a concentração do vírus — significa que a gravidade de qualquer doença é provavelmente maior e é mais provável que o paciente seja altamente contagioso.

“Quanto mais vírus houver dentro de mim, maior a probabilidade de transmiti-lo a você”, explicou a professora Wendy Barclay, do Departamento de Doenças Infecciosas do Imperial College London, no programa Newsnight da BBC.

Médicos e enfermeiros geralmente estão em contato próximo com pessoas altamente infectadas e portadoras de cargas altas de vírus em seus corpos, o que significa que estão constantemente expostos a uma grande quantidade de vírus.

Um paciente que estava sendo operado em um hospital em Wuhan, na China, infectou 14 profissionais de saúde antes mesmo de começar a ter febre, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

“Seu sistema imunológico, mesmo se você é uma pessoa saudável, tem grandes dificuldades em combater todos esses vírus. A quantidade de vírus com a qual você está infectado provavelmente determina o vencedor nessa batalha, na guerra entre o vírus e seu sistema imunológico”, observou Barclay.

“Se você infectar animais experimentais com diferentes doses de vírus, aqueles infectados com as doses mais altas são aqueles que sofrerão a doença com maior gravidade”, acrescentou.

Como a covid-19 entra no seu corpo
Se uma pessoa tem o vírus que causa a covid-19, também conhecido como Sars-CoV-2, ele pode se alojar na parte superior do trato respiratório, pronto para ser compartilhado pela respiração ou pela tosse.

“Toda vez que respiramos ou conversamos, enviamos gotículas para o ar originárias do nariz e da garganta”, explicou Barclay.

Algumas dessas gotas caem no chão e contaminam as superfícies. Por isso, é recomendável manter distância social e lavar as mãos.

Não está claro quantas partículas precisam entrar no corpo de alguém para que ela fique doente.

“Com a influenza, que é um vírus que conhecemos muito, apenas três partículas precisam entrar no corpo de uma pessoa para iniciar a infecção. Não sabemos esse número ainda no caso da Sars-CoV-2, mas pode ser muito pequeno”, disse Barclay.

A arriscada linha de frente da batalha
Ainda não se sabe com precisão o quanto a exposição repetida ao vírus poderia afetar a saúde dos profissionais da medicina, que estão na linha de frente do combate ao coronavírus.

No entanto, dados relacionados à epidemia de Sars ocorrida em 2002-2003 indicam que 21% dos infectados eram trabalhadores da saúde, segundo dados da OMS.

Padrões semelhantes surgiram entre aqueles que cuidam de pacientes com covid-19.

Na Itália e na Espanha, milhares de profissionais de saúde testaram positivo para coronavírus.

No início de março, as autoridades chinesas estimaram que 3,3 mil profissionais de saúde haviam sido infectados.

Isso significa que entre 4% e 12% dos casos confirmados de coronavírus correspondem a trabalhadores de saúde.

Um diretor de uma instituição de saúde britânica disse à BBC que até 50% da equipe do hospital está em licença médica em algumas áreas.

E se as medidas de controle de infecção falharem, os hospitais podem se tornar um foco viral.

Alguns médicos disseram à BBC que tentam dispensar prematuramente os pacientes que não são afetados pela covid-19, para evitar que sejam infectados.

Proteção insuficiente
Esse possível vínculo entre exposição e contágio é a razão pela qual, em muitos países, os profissionais de saúde ficam doentes por conta da falta de acesso a equipamentos de proteção individual (EPI).

Na França, os médicos entraram com ações contra o governo por — segundo eles — não terem conseguido aumentar a produção de máscaras e, portanto, colocá-los em perigo.

Médicos e enfermeiros do Zimbábue entraram em greve para protestar contra a falta de EPIs em um momento em que o país está em situação de emergência para tentar deter a propagação do vírus.

No Reino Unido, Neil Dickson, diretor executivo de uma organização de trabalhadores da saúde, diz que a falta de EPIs enfraqueceu a confiança dos médicos e enfermeiros.

Embora o governo britânico tenha começado a usar as forças armadas para distribuir milhões de máscaras aos profissionais da área médica, Dickson acredita que “levará algum tempo para reconstruir essa confiança”.

“O outro problema é que esses equipamentos geralmente são fabricados na Ásia, em particular, na China. E para a China, portanto, garantir o fornecimento a longo prazo será um desafio significativo”, acrescenta.

*A pesquisa para esta reportagem foi conduzida por Deborah Cohen, correspondente de saúde do Newsnight.

Fonte: BBC.com